31.3.07

P.219: Nem mel, nem fel


Sobre esta indústria blogueira

Aprecio nos blogues a originalidade das publicações, entendida não como uma procura desenfreada da diferença, mas como privilégio dado ao produto de própria autoria, seja a nível do texto, seja no da ilustração; aprecio a variedade nos temas, nos objectivos e, se possível, no próprio estilo da escrita. Gosto de um equilíbrio entre o sério e a brincadeira, o racional e o sentimental, o lógico e o absurdo (e se não houver equilíbrio, que haja, ao menos, umas notas dissonantes de vez em quando). De um modo geral, prefiro a composição curta e digo de um modo geral porque, como bem sabemos, há textos pequenos cheios de nós cegos e outros, longos, que se desfiam com toda a facilidade e prazer…
De resto, nem mel, nem fel, sendo que mel figura aqui como síntese de uma escrita uniformemente poética e de temática amorosa e fel como pura maledicência. Não incluo nestes últimos aqueles blogues temáticos vocacionados para a crítica humorística de figuras públicas que, ao serem-no, a isso se expõem. Falo dos outros, daqueles que por falta de assunto, de consistência e de talento, se ficam pelo vómito azedo dos autores sobre assuntos mesquinhos e desinteressantes das suas pobres vidas.

30.3.07

P.218: Feitiços e feiticeiros

A escola pública não pratica o “direito de admissão” e por isso há por lá um pouco de tudo. O ensino das competências sociais, como agora se chama, pomposamente, à boa educação é uma preocupação que cresce na medida em que aumenta, de forma visível e gritante, a falta delas. Já houve tempo em que esse ensino se fazia em casa, na família, e a escola se reservava para outras aprendizagens. Mas isso é passado. Hoje, como é do conhecimento geral, as famílias já não cumprem só por si esta tarefa, por razões múltiplas que alongariam este enunciado, e nalguns casos não a cumprem de todo, cabendo à escola substitui-las nesse papel.
Não vou explanar dificuldades nem tecer considerações sobre os prejuízos para outras aprendizagens para que a escola está/estava mais vocacionada.

Por vezes as pedagogias surgem inesperadamente de situações simples como a que está a acontecer com alunos meus, este ano. Constituem, justamente, um grupo que não primou pela exemplaridade escolar, se foi arrastando, envolvendo em complicações, até desembocar num percurso alternativo que lhe dará alguma qualificação profissional. Acontece que estes meninos-jovens, todos eles com um ou muitos “averbamentos no cadastro” estão a começar a ganhar alguma maturidade e faz parte da sua formação um estágio em escolas e A.T.L.’s, durante o qual devem tomar conta, animar e colaborar no ensino de crianças de Infantários e do 1ºCiclo. O problema é que a falta de competências sociais, é mal que grassa já entre esses miúdos pequenos que dantes eram os dóceis e principiantes alunos da “escola primária”… e aquilo que nós não conseguimos ensinar consistentemente aos nossos jovens estagiários, estão eles a aprendê-lo agora, sofrendo a indisciplina e a má educação na própria pele…!

Dos seus relatos já pudemos concluir várias coisas, entre elas que as piores situações acontecem com os filhos da comummente chamada gente bem, nomeadamente filhos de senhores professores e professores doutores da universidade local! São esses os que gritam que não fazem, que não querem, que tu não mandas nada aqui, que o pai disse que aquela actividade não tinha o mínimo interesse, que chamam nomes feios aos adultos…! E no A.T.L. particular, onde os educadores e professores estão porque não têm colocação noutro lugar, esta gente miúda vai mandando, como o consentimento de pais que não sabem sê-lo...
Seguramente que os nossos alunos estagiários vão aprender mais com esta experiência dura do que com todos os discursos e conselhos que lhes poderíamos dar, mas a mim não me sai já da ideia a perspectiva de ter estas pestes contaminantes, num futuro não muito longínquo, na minha sala de aula… e estes pais fora dela.

29.3.07

P.217: Sonho


Intersecções de luzes, sombras, transparências, brilhos, tempos…
Convivência de passados e presentes, de matérias e de ideologias, dos vivos e dos mortos que estão por trás de tudo!

Há lá ao fundo um espaço aberto sobre uma paisagem que não é daqui. E degraus de escada de uma história narrada. E colunas que nunca vira. E daquela porta de arcada gótica sairá alguém que nunca ali esteve. E os vasos suspensos já estiveram pousados algures…

Corre a fita do sonho, como um filme de coexistências surpreendentes, de hipo e hipertrofia de realidades, de sequências absurdas…. Acabará de repente. Quem saberá como começou…?!

26.3.07

P.216: PORTUGAL do pequenino...

Os Grandes Portugueses

Dir-me-ão que foi apenas um concurso, que foi manipulado, que é coisa caseira e sem visibilidade... A mim não deixará de me impressionar negativamente, de me envergonhar até, que uma figura mesquinha, falsa, um malévolo e tacanho bicho do buraco, responsável por tanta miséria recente e subdesenvolvimento de que ainda não recuperámos, ganhe um concurso de “grande”…! Nem que fora de “pequeno”, nem que fora o concurso lá do bairro da pobre terra de Santa Comba…! NÃO!!!
E… preocupa-me! Quer dizer o quê, esta votação?! Esqueceu o povo? Saberá quem vota quem foi Salazar?! Mobilizou-se mais um certo sector da sociedade? E com que motivações?! Será possível que os males posteriores tenham mascarado de bem os males do passado?! Depois de mim virá quem de mim bom fará? É esta a memória do povo? Esta a sua compreensão?!...

Para que conste, dos 10 mais votados e por ordem, para mim restam:

1º) Aristides de Sousa Mendes, porque a grandeza maior vem da dádiva sem retribuição, do sacrifício de mais do que a própria vida pelo bem alheio, pelo bem de muitos, de desconhecidos, de seres humanos…! GRANDE, grande Aristides!

2º) Luís de Camões, pelo saber imenso num mundo de ignorantes; por nos ter cantado e honrado; por em estilo grandiloquente ou em verso humilde ter demonstrado conhecer a humanidade como poucos e ser capaz de artisticamente a mostrar aos outros.
3º) D. João II, pelo visionarismo, pela disciplina dos nobres; porque sem a sua ambição e o seu pulso, creio, não teríamos nunca conhecido uma grandeza que nos forrasse de glória o passado, num presente pelintra…

4º) Fernando Pessoa, porque a inteligência e a sensibilidade, juntas, podem ter feito dele o homem infeliz que foi, mas desdobraram-se em composições múltiplas, de personalidades diversas, numa riqueza sem par.
5º) Marquês de Pombal, pela visão esclarecida, traduzida, para mim, em duas intervenções decisivas e dignas de admiração: o papel contra a Inquisição e perseguição dos Judeus; e a reconstrução da Baixa de Lisboa.

6º) D. Afonso Henriques, pelo sonho, pela perseverança e pela matriz pátria.

7º) Álvaro Cunhal, pela coerência, verticalidade, resistência. E pela literatura!

(Imagens da net)

P.215: Filme

Zwartboek
Holanda - 2006
145 min - Thriller
12 anos
Thom Hoffman (Actor)
Sebastian Koch (Actor)
Carice van Houten (Actriz)
Paul Verhoeven (Argumento)
Paul Verhoeven (Realização)



Num áspero sotaque holandês, revisitação da história, aparentemente inesgotável para o cinema, da Segunda Guerra Mundial. Eu sou fã do tema e não sei se isso me dá crédito ou, pelo contrário, me torna suspeita nas minhas apreciações.
O filme é fita de que se gosta sem exagerado entusiasmo. Há verdade na crueldade e na ternura, na traição, solidariedade e inquietação da vida vivida em permanente suspeição, aqui no cenário da Holanda de 1944. Há uma visão esclarecida, sem o maniqueísmo de muitas simplificadas propostas americanas. E o Livro Negro é, para além da metáfora que se adivinha, um referente de crucial importância…
Bom, mas sem surpresas.

25.3.07

P.214: À uma, duas...

Pensávamos nós que ficávamos a ganhar! Cá se fazem, cá se pagam! E, de mais a mais, contas são contas! À uma certinha, pra que não haja confusão nos óbitos e nos nascimentos e nas demais ocorrências dignas de registo a essas horas, lá pagámos a horinha que devíamos! E hoje andou a gente à míngua, e foi se quis, que isto de acertar o organismo pelas determinações decretadas ainda tem as suas dificuldades…!
Enfim, seja. E embora, que se faz tarde!

24.3.07

P.213: O. (V.) N. I.?


P.212: Segredos de Chá

Divulgo, pelo interesse que me merece o tema inspirador - o chá, a sua história, gostos e rituais.

A DançArte é a Companhia de Bailado residente do Teatro S. João, em Palmela.
Espectáculos dias 13 e 14 de Abril, às 22h00.
Reservas: Teatro S. João, 212338520

23.3.07

P.211: Improvisos

Improvisos em tom de azul sobre granito e colmo.
E, apesar da corda de nylon, há algo de não deliberadamente ecológico nestas reutilizações…
Restos de hábitos de vida sem desperdício.



(Lamas de Olo, Parque Natural do Alvão)
Conheci ainda e bem uma vida assim, ainda que urbana.
E, pelo carreirinho da memória, lembro o tempo do amolador de facas, lá na aldeia do meu pai, que também deitava um pingo nas panelas furadas e consertava guarda-chuvas (chapéus para os lixboetas); lembro as meias de vidro das minhas mãe, tia e avó, que iam para apanhar malhas; e, no mesmo local, se cortava a ponta dos nossos sapatos de criança, quando o pé crescia antes da ruína do calçado e era possível transformá-los em sandálias, assim como se aplicava joelheiras e cotoveleiras de napa nas calças e camisolas esburacadas da criançada; lembro um hospital de bonecas no Porto, onde a minha Tijuca foi, mais do que uma vez, para arranjar os membros partidos! Lembro até, imaginem só, a existência de tinturarias – havia uma na minha rua – onde as roupas, depois da bainha acima, bainha abaixo, aperta aqui, alarga acolá, batidas e esfoladas, iam mudar de cor para parecerem novas ou esconderem a nódoa resistente à benzina… E lembro, claro, ainda e também, os cordéis dos embrulhos, atados com arte, formando argola para o dedo transportar, com que se treinava a paciência no desfazer dos nós e se faziam, por vezes, pegas de cozinha; e os papéis de embrulho, dobrados e guardados; e… e…
Outro tempo? Sem dúvida. Se muito, se pouco longínquo, depende da perspectiva de cada um. Com toda a certeza mais pobre e nessa medida, pelo menos nessa, menos poluidor…

22.3.07

P.210: Correio de Timor

Nova, bonita, tinha uma vida razoavelmente organizada por Lisboa: emprego, casa, relações… Mas um apelo interior em embrião e um acaso da vida, puseram-na na rota das missões humanitárias e o chamamento das causas tornou-se a razão maior.
Arrendou o apartamento mal estreado, vendeu o carro, disse adeus aos estudos de gabinete, abraçou e sossegou como pôde a família e os amigos inquietos e foi-se à vida, à outra que a chamava mais.
Já esteve em Moçambique e na Nicarágua. Hoje escreveu-me de Timor.
É a corajosa aventureira da família e as palavras que se seguem são suas.


Finalmente vos dou algumas noticias deste lado do mundo!
Até agora tudo a correr bem :-)
Maravilhoso sobrevoar o azul do oceano e as várias ilhas dispersas até aterrar em solo timorense!... Emoções fortes. Dias muito cheios e algo agitados ao longo destas 2 primeiras semanas, em que TUDO é novo; e muita formação e orientação; e também formação contínua numa das questões centrais de momento: segurança! As restrições são muitas e a mobilidade em Dili, e em algumas zonas do país, é restrita. Enquanto staff da ONU estamos sempre com o rádio alerta e em comunicação com o Dept. de Segurança, para conhecermos a situação sobre eventuais distúrbios e violência em certos bairros da cidade. Quando há problemas simplesmente não circulamos. Alguns carros da UN foram atingidos com pedras, mas por agora a situação acalmou… pelo menos parece.
O ambiente de trabalho é fantástico, pessoas de todo o mundo... (…) Na missão temos mesmo que ser o mais abertos e flexíveis possível. Tudo pode mudar, hoje parece estar tudo bem, amanhã poderá não estar... Fui inicialmente colocada no Distrito de Lautem, em Lospalos, o distrito mais a Este e remoto e que dizem ser LINDO!! (…) Mas depois pediram-me para ficar em Dili. (…) Mudança de planos. Vai ser uma experiência muito diferente, ficar em Dili, mas talvez depois (…) possa ir para os Distritos, fazer algum trabalho de campo.Timor parece ser um País LINDO, muito rural e verde, a natureza em redor de Dili é incrivelmente bonita. Mas Dili é uma cidade muito pobre, destruída, suja… muito, muito pobre.
Enfim, mais um sítio que me põe a pensar e a relativizar muita coisa... (…)
Beijo grande,
J.

21.3.07

P.209: Calendário


Há oito anos que esta companheira me saúda, todas as manhãs, à janela da cozinha. Hoje é o seu dia, mas a Primavera amanheceu ventosa e fria, a lembrar que, por estas paragens, é só pequena trégua nos nove meses de Invernia.
Atrás do tronco que oscila e dos ramos que se agitam, escondi o Sol nascente e registei a menina da minha janela. Bom dia e boa Primavera!

20.3.07

P.208: Tempo, o grande tirano!


Uma vez por outra, os olhos pousam nas mensagens reencaminhadas e, mais raramente ainda, encontram qualquer coisa que lhes merece atenção.

Aconteceu com um artigo que talvez conheçam, ele circula por aí, supostamente de Airton Luiz Mendonça, supostamente do jornal O Estado de S. Paulo. Faz considerações sobre o tempo, os mecanismos mentais associados à sua passagem e à percepção que temos dela. Assim uma espécie de abordagem do tempo psicológico, eivada de axiomas de cientificidade não atestada, mas que, ainda que possam ser meras especulações, servem perfeitamente de pontos de partida e de orientação para o desenvolvimento de pontos de vista interessantes.

Sintetizo e “traduzo” para o português materno.

Defende o autor que os pensamentos repetidos, automatizados, são apagados da nossa noção de tempo. O cérebro apaga a experiência repetida, que não aparece no “índice de acontecimentos” do dia. Se, ao contrário, vivemos uma experiência nova, o cérebro dedica muitos recursos ao processamento dessa informação, sentimo-nos vivos e o tempo alonga-se.
Conforme envelhecemos, as coisas começam a repetir-se e as experiências novas, aquelas que fazem a mente parar e pensar, fazendo com que o dia pareça ter sido longo e cheio, vão diminuindo. O tempo acelera e parece que os Natais chegam cada vez mais rapidamente.
O que faz parecer que o tempo corre é, portanto, a rotina. Introduzir diferenças nessa optimização que também é necessária, e vivê-las com intensidade, fará o tempo parecer mais longo
É assim com as mudanças de roupas, de decoração, de tipo de destino de férias, da loja para comprar… Com a organização de festas e de encontros, de viagens e contactos com culturas diferentes, com a visita a parentes que não vemos há muito, com o curso que já não era suposto frequentarmos… Enfim.
Quebras no tempo adormecido. Matéria para o cérebro processar e o tempo parecer crescer…

O texto deixou-me a pensar. Tenho, por vezes, a percepção inversa: a de que o tempo preenchido e vivo é que voa…! Mas, por outro lado, quando "muita coisa acontece" num curto espaço, parece que o tempo cresceu...!
E talvez por isso evoque neste momento uma certa peau de chagrin, associada à ideia de uma intensidade inversamente proporcional à longevidade… Mas esse tema ficará talvez para outro momento, num tempo futuro.

19.3.07

P.207: Centenário_I (5)

Mais uma página a lembrar Miguel Torga, em verdades simples e bonitas.


P E D A G O G I A

Brinca enquanto souberes!
Tudo o que é bom e belo
Se desaprende…
A vida compra e vende
A perdição.
Alheado e feliz,
Brinca no mundo da imaginação,
Que nenhum outro mundo contradiz!
Brinca instintivamente
Como um bicho!
Fura os olhos do tempo,
E à volta do seu pasmo alvar
De cabra-cega tonta,
A saltar e a correr,
Desafronta
O adulto que hás-de ser!


Miguel Torga


18.3.07

P.206: Palavras para esta imagem


A C T O R

Repousa. Nesse lastro branco já foste quase tudo. Nesse soalho que pisas com pés inventados, firmezas desconhecidas. Nessa luz que te acende para seres outro sendo muitos, sendo tu melhor.
Repousa no silêncio e na obscuridade do depois. Correu o pano vermelho do teu sinal. Espera-te a tua pele e a gente para quem representas o papel mais difícil…
(Palavras inspiradas na fotografia de "puta_madre")

17.3.07

P.205: Vamos embora?

“Daqui em Diante” teve como fonte inspiradora a belíssima ficção Worstward Ho, de Samuel Beckett, que este ano comemora os 100 anos do nascimento. Do estudo daquela obra ficou-nos a procura de um lugar, de um espaço para estar, para dizer, se dizer. Momentos privados presos ao tempo. Partilhas individuais marcadas pela solidão e o vazio. Um humor subtil, a tristeza, a ternura e a cruel beleza da realidade serão os pontos de união no espaço colectivo onde se reescrevem as lembranças. Vestiremos as nossas verdades para as poder despir com despudorada inocência.
Teatro de Vila Real
Prometia ser um bom espectáculo... e, no entanto, o apelo para abandonar a sala ao intervalo foi irresistível para mim e para muitos outros espectadores.
O absurdo cansa. Talvez pela insistência em metáforas de grande evidência que nos deixam à espera de mais. Talvez por uma originalidade dificultosa. Talvez porque demasiado próximo da vida...
Bem diferente da impressão que me deixou esta outra companhia e espectáculo.
Não há dúvida de que a arte é subjectiva, como o são os gostos.

16.3.07

P.204: (Joga-se o) civismo - III


Ora essa! Então lá porque vivo no centro histórico, não havia de secar a minha roupa...?!!

Quem não quiser que não olhe!!

14.3.07

P.203: (Joga-se o) civismo - II



E todos têm que saber...?!

13.3.07

P.202: (Joga-se o) civismo - I


Dentro, não pode fotografar.
...
:-)

12.3.07

P.201: A tentação da exclamação!

E se em vez disto ?????? estiver isto !!!!!!

desencadeia-se uma guerra?
Desencadeia-se uma guerra!

(a propósito das declarações de Hans Blix)

P.200: O oito e o oitenta

«Não concebo a vida, Excelências, desde que o taberneiro da esquina possa discutir a opinião d’el-rei, nem me seria possível viver desde que a minha opinião valesse tanto como a de qualquer arruaceiro».

Leio estas palavras da personagem Miguel Forgaz, da peça Felizmente Há Luar!, governador do reino na ausência de D. João VI, quando o país iniciava a sua despedida da monarquia absolutista e, pelos caminhos de relações que tomam tantas vezes os pensamentos, ora mais rectos, ora mais sinuosos, venho desaguar neste tempo que vivemos e na actual opção “informativa” de muitos dos nossos canais televisivos.

Na perseguição do objectivo de estar mais tempo e mais próximo dos locais de notícia, as televisões inundam-nos de opiniões anónimas do vulgo ignaro, quase sempre verborreia sem ideias e sem culpa. Culpado é quem as pede e quem as impõe, esbanjando um tempo precioso com contrafacções informativas.
“Tenho aqui comigo…” e o Zé e a Maria nem precisam de dar o cu e cinco tostões para aparecerem na T.V.. Basta dizerem o que não viram, mas viu o vizinho e a prima, que é quase a mesma coisa. E que inveja a da cunhada! E que sorte a deles estarem ali a tempo de acudir àquela pobre jornalista que, nervosa e sem saber que dizer, lhes pede a eles que digam!...

E o zapping nem sempre nos safa, porque só um canal escapou, até ver, à epidemia…
Não é a primeira vez que aqui falo disto, mas não me tenho apercebido de sinais de mudança. Numa altura em que a exigência e o rigor chegam a todos os sectores de actividade, surpreende-me que a quantidade, o preencher o tempo de emissão de qualquer maneira, continue a praticar-se descaradamente!

11.3.07

P.199: Olhar

No Porto, esqueçam-se as paredes poluídas dos primeiros andares e o ar façanhudo e pouco cuidado dos transeuntes apressados.
No Porto, mirem-se os cimos de belas surpresas...!
Monumental e bonita cidade!

10.3.07

P.198: Entardecer(es) de azul

E há, também, entardecer(es) de azul, com direito a assistir ao ousado mergulho das nuvens arredondadas na superfície limpa das águas!


E como é isso de mergulharem as nuvens nas águas se elas não se soltam do céu e ainda que se soltassem, para mergulhar, o que se diz mergulhar, teriam que penetrar além da superfície, é somente maneira de dizer que a água reflecte o céu, e então porque não é dito dessa maneira simples, porque há gente que gosta de dizer as coisas de forma diferente da usual, e porque será isso, porque fugindo da banalidade do dizer acreditam escapar à banalidade da vida, e escapam, quem o saberá, sei eu que tu me pareces uma dessas pessoas, serei, serei…

9.3.07

P.197: Entardecer(es) de ouro

Cores do Ouro
O ouro amarelo é formado pela mistura de ouro puro, prata e cobre; e o vermelho pela mistura de ouro puro, cobre, prata e zinco.
O ouro branco é conseguido com a mistura de ouro puro, zinco e cobre, ou ainda por ouro puro, níquel ou paládio.
Diz quem sabe...
Eu digo que estes ouros foram obtidos com uma Sony Cyber-shot... Pequenas-grandes relíquias do meu guarda-jóias. :-)

8.3.07

P.196: Retrato de Mulher

Foi a terceira de seis irmãos e nasceu nos alvores da Grande Guerra (que só passou a ser conhecida como Primeira Guerra Mundial com o eclodir da Segunda, naturalmente). Herdou os vestidos da irmã mais velha e ganhou fibra e rebeldia no seio de uma família de mãe severa e fria e pai bonito, mas mal sucedido nos negócios e na política, que, desastradamente, mergulhou a família na adversidade. Soube sempre o que isso era, com a perda de irmãos tuberculosos, a perseguição política do marido, as dificuldades económicas, as relações familiares tensas. E quando veio a fartura de uma reforma condigna, fora-se-lhe a consciência do valor dos números e já não soube festejá-la… Ironias de um destino sem graça: justiça póstuma em vida!
Fez-se bonita e forte. Falou mau Francês e tocou sofrivelmente piano, mas enquanto a maioria bordava enxovais, formou-se professora, das primeiras mulheres habilitadas na cidade do seu tempo! Chegou mesmo a tirar carta e a conduzir diariamente para o trabalho, embora o volante e os pedais nunca tenham deixado de a enervar.
Foi um pilar da família. Criou filhas, sobrinhas órfãs, netos. Amparou o marido, orientou os irmãos e os sobrinhos, suportou estoicamente a mãe e as políticas mesquinhas de Salazar…
Minha avó, é o teu retrato que elejo neste dia!

2.3.07

P.195: Aprendizagens...

«Deveria isto bastar, dizer de alguém como se chama e esperar o resto da vida para saber quem é, se alguma vez o saberemos, pois ser não é ter sido, ter sido não é será (...)».

Memorial do Convento, José Saramago



Quando, na preparação do meu trabalho, deparo com afirmações como esta, sinto que sou talvez a mais verdadeira aluna do meu ensino…! :-)

P.194: Estranhas figuras

de Cristo(s)




ou outros

da autoria do escultor

José Rodrigues.