Escolhi este poema como poema de Natal pela sua alegoria, mil vezes glosada, e quase sempre tão expressiva, da viagem-vida.
Somos passageiros e passageiros com apeadeiro certo, em tempo e parte incertos! Temos, entre todos, esta irmandade no destino, ainda que tudo o resto nos separe.
Que a consciência disso nos aproxime e nos torne mais fortes no percurso tormentoso.
Se nos foi permitido sorrir e dar as mãos, por que seguimos indiferentes e carrancudos?!...
PASSAGEIRO
Sou um passageiro.
Isto em bom português
quer dizer: estou de passagem.
Virá um dia em que caduque
a minha validade.
Só o comboio é perene,
inextinguível.
Por isso é uma gratuita
crueldade a voz do altifalante
dizer de vez em quando:
- Senhores passageiros, isto.
- Senhores passageiros, aquilo.
Passageiro.
Caramba,
não preciso que mo lembrem.
Não me enterrem mais
a coroa de espinhos:
já me está apertada,
fundida com o crânio quanto baste.
A.M.P.C.