29.5.06
25.5.06
Página 94: «Douro: Pizzicato e Chula»
Palavras
Que queres, Douro, de mim?
Não posso senão palavras,
geralmente bisonhas
(ainda quando em ebulição).
Rilho como um osso rijo
demais para os meus dentes decadentes
o desconcerto de me ver em pleno rio
— eu, que não sei nadar! –
a opor palavras contrafeitas
aos ruídos que salteiam este sítio
tão alegremente:
água a chofrar nas ilhargas do barco,
algum pássaro insurrecto ao silêncio
gritando pelo céu fora,
marulhar de vento
naquele renque de choupos.
Com tanto rumor nativo,
com tanto rumor sadio
— para que diabo, Douro, quererás
as intrusas
palavras inquinadas do poeta?
A. M. Pires Cabral
fotografia de Carlos Sampaio
PRÉMIO D. DINIS
O Prémio D. Dinis 2006 foi atribuído, por unanimidade,
ao escritor António Manuel Pires Cabral, pelo seu livro "Douro: Pizzicato e Chula".
Prémio Literário instituído pela Fundação da Casa de Mateus em 1980 e atribuído a uma obra de poesia, ensaio ou ficção, publicada no ano anterior ao da atribuição do prémio.
Foi atribuído pela primeira vez em 1981.
23.5.06
15.5.06
14.5.06
6.5.06
Página 90: Sigmund

F. engravidou aos 16 e quando começaram as dores de parto pensava que os meninos “se cagavam”, como lhe parecera perceber pelas inúmeras experiências de nascimentos a que assistira pelo buraco do tabique que a separava do “quarto” dos pais. Não invento nada e F. não é, sequer, uma vetusta representante provinciana do meu sexo. Andará na casa dos 50 e conta-me isto com a mesma naturalidade com que me fala das investidas do pai sobre a mãe, homem, pelos vistos, sempre disposto à função e pronto a enxotar, sem grande disfarce, a filharada do local onde o desejo o assaltasse, tipo: “inda a gente num dera as costas, já ele birava minha mãe num monte de palha”!
Penso nisto quando hoje ouço, no noticiário, ilustres estudiosos portugueses falarem, a propósito da comemoração dos 150 anos do nascimento de Freud, na “exposição das crianças à sexualidade dos adultos”…
E depois, a esta mais evidente e chocante história, vêm, naturalmente juntar-se as próprias e inconfessáveis recordações de um tempo infantil e adolescente, bizarrias em que se entrechocam os valores atávicos do meio pequeno, com os alvores da liberdade num meio familiar timidamente intelectual e progressista…
E algures entre esse tempo e o momento presente, o grito de Ipiranga que me permite, hoje, dormir sem sobressalto as noites e enfrentar tranquila os dias…
Parabéns a você, Herr Sigmund!
Penso nisto quando hoje ouço, no noticiário, ilustres estudiosos portugueses falarem, a propósito da comemoração dos 150 anos do nascimento de Freud, na “exposição das crianças à sexualidade dos adultos”…
E depois, a esta mais evidente e chocante história, vêm, naturalmente juntar-se as próprias e inconfessáveis recordações de um tempo infantil e adolescente, bizarrias em que se entrechocam os valores atávicos do meio pequeno, com os alvores da liberdade num meio familiar timidamente intelectual e progressista…
E algures entre esse tempo e o momento presente, o grito de Ipiranga que me permite, hoje, dormir sem sobressalto as noites e enfrentar tranquila os dias…
Parabéns a você, Herr Sigmund!