P.224: Tentações
A semana era de limpeza geral da casa e de intensa actividade na cozinha. Era essa a azáfama de que eu mais gostava. Os meus avós eram padrinhos de meio povo e havia que fazer folares e pães de ló para essa gente toda. Chamavam-se reforços para bater os ovos com açúcar e, com um bocado de sorte, lá me deixavam rapar os alguidares… Depois, estendiam-se pelas mesas, cobertos com guardanapos brancos, ou com uma toalha longa, perfumando os ares da casa, enquanto os afilhados não vinham à sa’bença, deus t’ abençoe, meu filho.
Por cisma da minha avó, o que ficasse mais bonito, fofo e de aspecto apetitoso, havia de guardar-se para o sr. abade e seus acólitos, quando o Compasso passasse e todos fossem servidos do tradicional cálice de vinho fino.
Das amêndoas de açúcar nunca gostei muito e as de chocolate eram raras na altura.
Tudo o resto – visita Pascal, comunhões e crismas, missa, procissão – era supérfluo. A Páscoa valia pela lambarice. Agora, nem isso!
3 Comments:
"Lambarice": nunca mais tinha ouvido esta palavra! Era a minha avó que a dizia quando eu era criança.
Tudo vale aquilo que em nós queremos que valha..se não pelo passado, que valha pelo futuro..
Maria, Feliz Páscoa..
um abraço
intruso
Esta época sempre me irritou... começava no dia dos ramos com a obrigatoriedade de entregar o ramo à minha madrinha, que se sentia ofendida se não o recebesse! Continuava no dia da visita pascal que me obrigava a permanecer em casa toda a tarde!
E, por último, a obrigação mais penosa que cumpria simuladamente sob o olhar ameaçador de religiosidade da minha mãe: beijar a cruz!
Valia-me os «bolos podres» que ajudava a fazer à minha avó na véspera para me adoçar a boca!
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