20.4.06

Página 85: a sublime forma de exprimir

a frustração... Num poema que, descoberto ao 18 anos, se impôs na sua estranheza, como um murro no estômago... numa altura em que o estômago aguentava, felizmente, estes e outros abusos.
Hoje, esquecida a estranheza, permaneceu a sublime forma de exprimir a frustração da mediania... Claríssima e tão precoce percepção!

Um pouco mais de sol - eu era brasa, / Um pouco mais de azul - eu era além. / Para atingir, faltou-me um golpe de asa... / Se ao menos eu permanecesse aquém...


Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído / Num grande mar enganador de espuma; / E o grande sonho despertado em bruma, / O grande sonho - ó dor! - quase vivido...


Quase o amor, quase o triunfo e a chama, / Quase o princípio e o fim - quase a expansão... / Mas na minh'alma tudo se derrama... / Entanto nada foi só ilusão!


De tudo houve um começo ... e tudo errou... / - Ai a dor de ser - quase, dor sem fim... / Eu falhei-me entre os mais, falhei em mim, / Asa que se enlaçou mas não voou...


Momentos de alma que, desbaratei... / Templos aonde nunca pus um altar... / Rios que perdi sem os levar ao mar... / Ânsias que foram mas que não fixei...


Se me vagueio, encontro só indícios... / Ogivas para o sol - vejo-as cerradas; / E mãos de herói, sem fé, acobardadas, / Puseram grades sobre os precipícios...


Num ímpeto difuso de quebranto, / Tudo encetei e nada possuí... / Hoje, de mim, só resta o desencanto / Das coisas que beijei mas não vivi...


Um pouco mais de sol - e fora brasa, / Um pouco mais de azul - e fora além. / Para atingir faltou-me um golpe de asa... / Se ao menos eu permanecesse aquém...

Mário de Sá-Carneiro

7 Comments:

Blogger Mónica said...

e o teu poema?

abril 20, 2006 9:58 da tarde  
Blogger Maria Manuel said...

Os meus? Alguns estão por aí, disseminados com a discrição possível neste blog...

abril 20, 2006 10:23 da tarde  
Blogger Mónica said...

falta um i em exprimir, comecei a ler pensado que era teu :-(

abril 20, 2006 10:32 da tarde  
Blogger Maria Manuel said...

Já não falta. E, realmente, só tu para pensares que esta coisa sublime podia ter sido escrita por mim!!...
Obrigada, linda! A tua generosidade é... QUASE... infinita! :-)

abril 20, 2006 10:37 da tarde  
Blogger Unknown said...

ai ai a vida tem coisas que se escondem por debaixo de algo que não conhecemos

abril 21, 2006 3:03 da tarde  
Blogger Mónica said...

como quem diz: a tua cultura poética é uma lástima!
hehehehe nula

abril 21, 2006 5:47 da tarde  
Blogger JL said...

Também eu, como a cantigas, comecei a ler pensando que era teu. E bebio-o como se teu fosse. Porque um poema deixa de ser do autor quando é sentido por quem o ama. Então é teu este poema que tu amas. Onde tu te revês. Um beijo e boa semana

abril 25, 2006 11:20 da manhã  

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