P.136: Marginando o texto
Li As Pequenas Memórias de José Saramago e, passando por cima da problemática que rodeia estas obras de cariz autobiográfico, como o saber – e raramente se sabe, mesmo quando o autor o diz… – até que ponto há ficção na reconstrução da identidade, registo alguns aspectos que achei curiosos.
O primeiro, e talvez mais surpreendente, é o da capacidade de recordar com nitidez e pormenor factos que ocorreram há mais de oitenta anos! Funcionamento bem intrigante, este da memória humana, que apaga às vezes o tão próximo e tão bem ilumina o longínquo!
Uma outra impressão curiosa que me fica desta leitura é a da identificação. De sexos diferentes, em contextos sociais, económicos, geográficos bem distanciados e com um intervalo de quarenta anos, reconheço e revivo experiências e sentimentos comuns da infância.
São, realmente, pequenas coisas, daquelas que nem lembra lembrar e que, porventura, todos vivemos de uma ou outra maneira.
Uma passagem saborosíssima, porque acordou em mim uma memória semelhante, me tornou consciente do facto e me fez sorrir, foi a da confusão na leitura e pronúncia de palavras.
Na verdade eu também tive os meus toques de dislexia, ou algo que se lhe parecia (…) Por exemplo embirrei que a palavra sacerdote deveria ler-se saquerdote (…) Uma outra que me vinha retorcida (isto são histórias da época da escola primária) era a palavra sacavenense. Além de designar um natural de Sacavém, povoação hoje engolida pelo dragão insaciável em que Lisboa se tornou, era também o nome de um clube de futebol (…) E como a pronunciava eu então? De forma absolutamente chocante que escandalizava quem me ouvia: sacanavense. Ainda recordo o meu alívio quando fui capaz, finalmente, de inverter as posições das mal-educadas sílabas.
No meu caso, as vítimas foram as palavras algures e transeuntes, que aí até aos nove ou dez anos pronunciei, convencida de que lia bem, alugueres e transuentes…! A diferença está em que não as lia em Cartilhas, nem em números do Século, mas em livros de aventuras escritos por Enid Blyton…
Na verdade eu também tive os meus toques de dislexia, ou algo que se lhe parecia (…) Por exemplo embirrei que a palavra sacerdote deveria ler-se saquerdote (…) Uma outra que me vinha retorcida (isto são histórias da época da escola primária) era a palavra sacavenense. Além de designar um natural de Sacavém, povoação hoje engolida pelo dragão insaciável em que Lisboa se tornou, era também o nome de um clube de futebol (…) E como a pronunciava eu então? De forma absolutamente chocante que escandalizava quem me ouvia: sacanavense. Ainda recordo o meu alívio quando fui capaz, finalmente, de inverter as posições das mal-educadas sílabas.
No meu caso, as vítimas foram as palavras algures e transeuntes, que aí até aos nove ou dez anos pronunciei, convencida de que lia bem, alugueres e transuentes…! A diferença está em que não as lia em Cartilhas, nem em números do Século, mas em livros de aventuras escritos por Enid Blyton…
6 Comments:
Muito!!
... e agradecida, naturalmente!
:-)
Tenho passado silenciosamente por aqui e sempre agradado das fotos..tens sentimento para a fotografia..hoje quebrei o silêncio, para te dizer que "vive cada dia, como se em cada dia, deixasses de viver" .. hoje são 9 e não 11 :-)
intruso
Dislexia? Consfusão na escrita de palavras??
Posso preguntar o que é? A mim, não é coisa que me aconteça assim ferquentemente!!
:-))
Ok, Carlos. Não se pode ser prefeito... ou será perfeito...?!
Boa questão...
Normalmente deixo-a para o verificador ortográfico do editor.
O pior é que segunda a teoria deste post, isto deveria passar com a idade, mas os meus "pres/pers"...!!!
Se calhar é porque ainda me falta idade!
:-)
É que neste caso concreto, o corrector ortográfico não te pode ajudar: as duas palavras constam do dicionário!...
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