10.3.08

P.401: Arte que se explica


Falemos de arte visual, por exemplo, daquela difícil, da que tem que ser explicada em palavrosos discursos mais elaborados que a própria peça que os suscita… :-)
Fui professora acompanhante de uma visita de estudo de alunos a Serralves, exposição de Robert Rauschenberg, e a minha delícia maior foram as reacções espontâneas dos miúdos face às propostas artísticas e às trabalhosas interpretações simbólicas debitadas pelo guia.
Quem não entende – depois de bem explicado – que uma banheira antiga, de aspecto gasto, assente sobre pés, meia de água, com garrafão submerso, suspenso de uma corda que desce de uma assemblage metálica que paira sobre o conjunto, representa Veneza? E quem não entenderá como legítimo o desabafo surdo de uma aluna ao meu lado: dizem que Veneza é tão linda…! Isto, professora?!
Recomendo-lhe atenção e abertura à novidade. Na aula falaremos. Mas compreendo-a, assim como entendo os olhares deles desconfiados sobre a escultura das almofadas, do pneu de carro rasgado, das caixas de cartão velho… da “carreta” de jardim enferrujada…

Dirão: grande parola! À vontade. Esta bourgeoise já foi suficientemente épatée para reagir às mais ousadas propostas. O que acontece é que não prescindo do gosto, do meu, e esse não se rege pela inovação ou pela tradição, pela ruptura ou pela obediência a cânones, mas pela emoção e pela adesão do meu espírito ao objecto de arte.

O que me agradou em Rauschenberg foi o desafio da descodificação das simbologias, o discurso em torno das possibilidades, descobertas muito mais próximas do meu universo que as próprias esculturas ou os desenhos sem lápis das suas pindéricas pirâmides do Egipto…

Imagens: Museu de Serralves e http://geometricasnet.blogspot.com/