31.3.08
P.413: Contas-me como foi?
Vivo por vezes um pouco a fantasia de A Rosa Púrpura do Cairo: esbato limites, incorporo a ficção na realidade. Estou entre esses miúdos e vamos brincar aos índios e cowboys, sendo que, certo e sabido, eu serei índia, pela "pinta" e pelo gosto, remoto, das minorias e das causas perdidas…
Que bem me sabe!
30.3.08
P.412: Do Catar, sem amor!
Quanto ao mais, só corrupção, pobreza, politiquice, degradação… Um olhar tão selectivo e tão uniforme no seu critério de mostrar o mau, que temos que concluir com surpresa uma predeterminação!
De onde virá este sem-amor talvez fosse interessante esclarecer. Mas, que me conste, não houve portugueses que, ofendidos na sua honra nacional, viessem para a rua, na sequência disto, clamar contra o Catar, pedir a cabeça dos jornalistas da Al Jazeera, queimar as suas bandeiras… Costumes dessas paragens médio-orientais que, felizmente, não cabem aqui. Antes assim.
Fica por esclarecer toda a verdade sobre o envolvimento dos Sá Fernandes no tendencioso olhar…
29.3.08
P.411: Ilustres casas...
Hoje os proprietários – viúva e três filhos – são de uma outra família, fidalga ou plebeia não sei dizer, mas seguramente a braços com uma herança pesada em história, renome e preço de reconstrução! O estado é calamitoso: um fantasma triste, abandonado numa paisagem aberta e linda!
27.3.08
P.410: Do corpo
Desaparecer na curva do caminho.
Aqui és corpo; e injuriar o corpo
É pisar a sombra do divino.
Lúcida a carne, num fugaz milagre,
É de eternos assuntos a medida:
De ar, água, terra e fogo sumidade,
Lugar de amor onde se ganha a vida.
Se concorrem na alma embuste e danos,
O corpo em qualquer língua é verdadeiro.
P’ra que ao além não fie a Parca enganos,
Retrata-nos a morte em corpo inteiro.
Vem das estrelas o sangue que nos guia
E em amorosa perfeição na carne
Está toda a eternidade resumida.
Corpo! Sombra de deus. Simples verdade.
Natália Correia
Nem todo o corpo é carne… Não, nem todo.
Que dizer do pescoço, às vezes mármore,
às vezes linho, lago, tronco de árvore,
nuvem, ou ave, ao tacto sempre pouco…?
E o ventre, inconsistente como o lodo?...
E o morno gradeamento dos teus braços?
Não, meu amor… Nem todo o corpo é carne:
é também água, terra, vento, fogo…
É sobretudo sombra à despedida;
onda de pedra em cada reencontro;
no parque da memória o fugidio
vulto da Primavera em pleno Outono…
Nem só de carne é feito esse presídio,
pois no teu corpo existe o mundo todo!
25.3.08
P.409: Sejamos francos!
22.3.08
20.3.08
P.407: Casulas e botelo
Uma das minhas refeições do fim de semana de Páscoa será, provavelmente, de casulas e botelo ou, dito por outras palavras, vagens secas de feijão e chouriço de ossos. A ementa é mais adequada ao Carnaval, mas só agora me calhou em sorte dar um salto a Mogadouro e aterrar numa animada e bem sortida feira de artesanato e produtos da terra. Nunca provei, mas asseguram-me os conhecedores que é um petisco! Não fora outras preocupações e viria de lá carregadinha das coisas apetitosas que trouxe na memória, mormente um pão grande e cheiroso, vários queijos, grande variedade de biscoitos de aspecto e de nomes sugestivos…
“Dar um salto” a Mogadouro é, ainda, uma expressão muito optimista, mesmo para quem parte de cerca de 136 km de distância. Duas horas e meia bem medidas e a paciência de meio percurso em estrada antiga e sinuosa… daquelas que já muitos portugueses desconhecem, mas que ainda abundam nos interiores esquecidos. Talvez também por essa razão, o acolhimento é fantástico, como que a pedir ao viajante desculpa pela difícil empreitada de lá chegar.
Trás-os-Montes é região grande e variada. E quando assim rumo a Este, atravessando a Terra Quente, ouvindo a gente, apreciando produtos locais, sou obrigada a reconhecer que a zona de Vila Real pouco tem a ver com esse Nordeste profundo. O mesmo acontece se a incursão for para Norte, em terras de Boticas e Montalegre. Más estradas e clima agreste, secundados pela geografia do terreno, mantiveram cada terra com seu uso… E se era bom que se resolvessem as incomodidades e dificuldades dos acessos – o que está ainda longe de acontecer –, seria muito agradável que ao mesmo tempo se mantivesse a diversidade de produtos e tradições gerados na anterior pobreza e isolamento…
19.3.08
18.3.08
P.405: Portugal é um jardim...
Todos sabem, e muitos o dizem: “Portugal é um jardim à beira-mar plantado”. Agora aquilo sobre que nem todos acertam é a autoria da repetida referência.
A PORTUGAL
Meu Portugal, meu berço de inocente,
lisa estrada por onde andei, débil infante,
variado jardim do adolescente,
meu laranjal em flor sempre odorante,
minha tarde de amor, meu dia ardente,
minha noute de estrêlas rutilante,
meu vergado pomar de um rico outono,
sê meu berço final no último sono!
(…)
Jardim da Europa à beira-mar plantado
de louros e de acácias olorosas,
de fontes e de arroios serpeado,
rasgado por torrentes alterosas,
onde num cêrro erguido e requeimado
se casam em festões jasmins e rosas;
balsa virente de eternal magia,
onde as aves gorgeiam noute e dia!
(…)
Tomás Ribeiro, D. Jaime
17.3.08
P.404: Uni.form.idades
Se prestou muita ou pouca atenção à leitura das primeiras notícias, não poderei dizê-lo, embalada pelas divagações em que me lanço quando, para lá do vidro, corre uma paisagem bonita mas sem surpresas. Não sei, por isso, há quanto tempo o homem estacionara naquela artigo que o meu olhar, regressado ao interior da camioneta, apercebia por entre os dois bancos: uma bela loiraça, provocante e nua, enchia por inteiro a página onde o tipo, demoradamente, lia, talvez nas formas, na pele… na memória?... os encantos daquela notícia fresca!
Sorri. E as minhas cogitações seguiram um outro rumo em que, confesso, o sexo oposto, com a sua bastante ampla uniformidade reactiva, sem diferença de classe, cultura, proveniência, idade... , não saiu muito lisonjeado… :-))
15.3.08
P.403: Ânimo!!
Aqui fica, um sopro da sua enérgica alegria:
14.3.08
P.402: Pesadelo!
No meu pesadelo chovem papéis sobre a minha cabeça. Amontoam-se-me à volta os decretos, os despachos, os convites, as cartas, os anúncios, os regulamentos, normas e circulares , avisos, informações, reclamações, notas explicativas, formulários, grelhas… Tento agarrá-los, evitar que se depositem em torno de mim, lê-los. Mas escapam-se-me das mãos, dançam na minha frente, fogem-lhes as letras… Cresce a ansiedade e a aflição à medida que vou ficando submersa…
Para já tenho sido salva, in extremis, pelo despertador!
10.3.08
P.401: Arte que se explica
Recomendo-lhe atenção e abertura à novidade. Na aula falaremos. Mas compreendo-a, assim como entendo os olhares deles desconfiados sobre a escultura das almofadas, do pneu de carro rasgado, das caixas de cartão velho… da “carreta” de jardim enferrujada…
Dirão: grande parola! À vontade. Esta bourgeoise já foi suficientemente épatée para reagir às mais ousadas propostas. O que acontece é que não prescindo do gosto, do meu, e esse não se rege pela inovação ou pela tradição, pela ruptura ou pela obediência a cânones, mas pela emoção e pela adesão do meu espírito ao objecto de arte.
O que me agradou em Rauschenberg foi o desafio da descodificação das simbologias, o discurso em torno das possibilidades, descobertas muito mais próximas do meu universo que as próprias esculturas ou os desenhos sem lápis das suas pindéricas pirâmides do Egipto…
P.400: Quebra (do silêncio)
Voltei para uma gargalhada seca. Pertenço aos cento e muitos mil professores que não percebem a bondade dos propósitos da senhora Ministra da Educação e da sua equipa e, não fora uma sólida confiança no meu discernimento e trabalho, estaria agora aqui lançando lágrimas e não os amargos sorrisos de quem trabalha sob ou apesar (dependendo das interpretações) de todas as políticas…
Esqueçamos estas tristezas com que temos que pagar as dívidas, hélas!, e falemos de outras coisas.